Travessia da Sierra Nevada
A travessia da Sierra Nevada pelas suas cumeadas e cumes com mais de 3.000 metros, designada por muitos como a “Integral dos 3.000”, começou a ser planeada em 2009.
De todas as consultas realizadas sobre esta actividade, a altura ideal para a sua realização, era sem dúvida nos meses de Verão.
O ponto negativo da escassez de água era compensado pelo elevado número de horas de luz diárias e também pela vantagem da logística, diminuindo, e em muito, o peso que se teria de carregar para garantir uma actividade em autonomia.
O ponto negativo da escassez de água era compensado pelo elevado número de horas de luz diárias e também pela vantagem da logística, diminuindo, e em muito, o peso que se teria de carregar para garantir uma actividade em autonomia.
Pesando prós e contras, tendo em conta disponibilidades e previsões meteorológicas, o mês escolhido foi Outubro de 2009.
Não haveria o número de horas de luz ideal, a logística de material já era maior do que a necessária para uma actividade de Verão, mas ainda seria possível avançar sem recorrer a todo o material de Inverno que, aí sim, o peso seria de tal maneira incrementado que aumentaria, em grande, o grau de dificuldade da travessia.
Da planificação à concretização:
1º Dia
Chegada a Trevelez com reconhecimento do trilho nº 24 (mapa e guia PNSN) o qual tem início na Calle Real, junto à Igreja do Bairro Médio, seguindo por uma pequena estrada que desce até ao rio Trevelez.
2º Dia
Início da travessia em autonomia, previsivelmente durante 6 dias, com mochila carregada a rondar os 25 Kg(tenda, saco-cama, fogão, gás, tachos e afins, 3 camadas de roupa, 3 litros de água, Cerelac, massas, sopas , frutos secos e barras de cereais.
Do local de dormida até ao início do trilho, seguiram-se os sinais verticais com a indicação Horcajo (15').
A partir desse ponto inicia-se a subida pelo vale que se desenvolve paulatinamente ao longo do rio Trevelez (direcção Norte). O caminho estava a ser arranjado e as mariolas, inicialmente freqüentes, aos poucos passaram a pontuais.
Um significativo número de casas/ ruínas e abrigos de pastores e gado, marcou a chegada ao Horcajo.
Nesta zona, devido à existência de muitos cursos de água com a mesma orientação, a não visualização de qualquer mariola ou indicação e a enorme quantidade de gado bovino que se teve de evitar, tornaram mais difícil determinar a direcção a seguir.
Depois de se experimentar algumas das alternativas, acabou-se por seguir em direcção Norte para Puerto Jerez, mas incorrectamente pela encosta entre o rio do Barranco del Sabinar e o rio Puerto de Jerez.
A opção certa teria sido, depois do Horcajo, seguir para Norte e ao encontrar uma levada derivar para a direita (direcção Nordeste) até cruzar o rio Puerto de Jerez, seguindo pelo seu lado direito na base da Loma Granados.
Nota: Um pouco acima das construções do Horcajo, há uma casa junto à referida levada com uma área muito boa para acampar/bivacar.
Devido à imprecisão na orientação neste troço do percurso, a direcção escolhida não levou onde se pretendia (Puerto Trevelez – Refugio Postero Alto), mas, ainda assim permitiu um adequado enquadramento no novo itinerário adoptado. Já com a luz do dia a desaparecer, acampou-se junto ao rio Puerto de Jerez mas, nas encostas opostas e em frente às da Loma Granados, a 2500m.
Dia longo e “pesado” (mochilas com carga máxima) o que levou a um descanso prolongado até às 10:00 do dia seguinte.
3º Dia
A actividade do dia inicia-se com o reposicionamento no mapa e início da marcha directamente para o primeiro 3000 da travessia - Cerro Pelao (3181) – dado que estávamos na encosta Sueste deste cume.
A confirmação do correcto reposicionamento foi simples de aferir devido à triangulação de pontos claramente identificáveis no terreno por comparação com o mapa (em especial a Piedra de los Ladrones, cume de 2.994m com uma enorme rocha no topo, a Noroeste do Puerto de Trevelez ).
Depois do Cerro Pelao, seguiram-se Puntal das Juntillas (3139) e Picon de Jérez (3090), passando-se antes por um cume “sem nome I” assinalado no mapa (3114), El Contadero (3116) e Puntal de los Cuartos (3158).
A chegada ao local do acampamento, Laguna Juntillas, foi feita ainda com o “sol alto” (17:00), possibilitando a escolha de um bom local para montagem da tenda
Acampamento na Laguna Juntillas
4º Dia
Saída da Laguna Juntillas em direcção Sudoeste, fazendo uma diagonal para regressar à cumeada, atingindo la Mojonera (3126) e logo de seguida o Pico de la Justicia ou Atalaya (3135), depois o Pico del Cuervo (3144), seguindo-se uma aérea travessia até ao Collado de Vacares.
Seguindo as mariolas que levam à face Este do Puntal de Vacares, através de uma inclinada encosta, começa a ser perceptível um trilho no meio de uma extensa cascalheira de rocha miúda, o qual possibilita a ascensão até ao cume do referido Puntal (3136).
Puntal de Vacares
Seguindo sempre pela crista, um pouco mais à frente foi alcançado mais um 3000, o Puntal de Las Calderetas (3066), seguindo-se um outro pequeno cume “sem nome II” (3064).
Depois deste ponto, segui-se em direcção ao Puntal De El Goterón, ponto onde se inicia a crista de acesso ao Alcazaba.
No entanto, após observação atenta desta crista, concluiu-se que o acesso ao Alcazaba seria impraticável com as mochilas de autonomia, optando-se por não ir até ao referido Puntal e, ao invés, procurar uma zona para acampar na base dos Tajos del Goterón, junto a uma cascata seguida de um curso de água alimentados pela Laguna del Goterón, situada mais acima.
Ligação do Puntal das Calderetas ao Goterón
No entanto, após observação atenta desta crista, concluiu-se que o acesso ao Alcazaba seria impraticável com as mochilas de autonomia, optando-se por não ir até ao referido Puntal e, ao invés, procurar uma zona para acampar na base dos Tajos del Goterón, junto a uma cascata seguida de um curso de água alimentados pela Laguna del Goterón, situada mais acima.
Até esta noite, apesar das acentuadas amplitudes térmicas (25ºc/5ºc) o vento tinha dado tréguas mas, confirmando as indicações dos altímetros, o tempo começou a mudar, com rajadas de vento fortíssimas a fustigar a pequena tenda que servia de abrigo.
5º Dia
Sob o luar cada vez mais encoberto e com o aparente agravar da meteorologia, iniciou-se o dia com uma travessia diagonal para ultrapassar os Tajos del Goterón de modo a interceptar o trilho da lomba do Alcazaba.
Com o amanhecer e já na lomba (3100), confirmou-se a alteração da meteorologia, nuvens carregadas passavam e envolviam os cumes mais altos da cordilheira.
Não tardou a que a chuva, batida por forte vento na desprotegida lomba, obrigasse a altertar definitivamente os planos e optar por se começar a descer em direcção à lomba de Culo Perro.
Seguiu-se um trilho descendente, que saía da lomba do Alcazaba com direcção Sudoeste e que não vem registado inicialmente no mapa mas, no terreno está indicado por mariolas.
Este trilho vai descendo as encostas superiores da lomba de Culo Perro até interceptar o trilho principal Trevelez/Siete Lagunas, precisamente na zona em que o rio é atravessado por uma pequena ponte (agora destruída) – El Vertedero.
Desde este ponto, seguiu-se o trilho principal nº 23 (mapa e guia PNSN) e a partir do abrigo de pastores La Campiñuela, este caminho começou a estar sinalizado por estacas de madeira com indicações até Trevelez.
Resumo 2009
Reconhecer que não é possível continuar, talvez seja das situações mais difíceis de determinar em montanha.
Aceitar, com consciência e tranquilidade, é o passo seguinte.
Qual o momento certo para o fazer?
Para isso não há regras matemáticas. Ter precessão dos limites de cada um e do grupo, não esquecendo nunca que a valia do todo terá sempre de ser equivalente à resistência do seu elo pontualmente mais vulnerável e saber sempre que ali quem dita às regras é o Meio, são as melhores ajudas que se podem ter para determinar a decisão.
Aqui, a decisão foi tomada com consciência plena de que seria a única opção sensata.
Bibliografia/Cartografia consultada: Mapa e guia do Parque Nacional da Sierra Nevada - La Alpujarra, Marquesado del Zenete (Escala 1:40 000) Editorial PENIBETICA.